A sociedade na era digital: impactos e transformações contemporâneas 

Transformações digitais moldam novas formas de viver, pensar, produzir e se relacionar na sociedade

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por ABES
10:00 am - 10 de junho de 2025
Imagem: Shutterstock

O século XXI é caracterizado por intensas transformações sociais impulsionadas pelo avanço tecnológico, reconfigurando as interações humanas e institucionais. A digitalização e o uso massivo da internet alteram a dinâmica da sociedade, introduzindo novos desafios relacionados à segurança, privacidade e sustentabilidade (Castells, 1999). Modelos teóricos como a sociedade da informação, a sociedade de risco, a sociedade do espetáculo e a sociedade do cansaço fornecem interpretações sobre esse contexto e seus efeitos sobre indivíduos e coletividades. Este artigo analisa esses modelos e suas implicações na sociedade contemporânea, destacando os impactos da era digital na estrutura social, econômica e psicológica. 

Sociedade informacional: centralidade do conhecimento e tecnologia 

A sociedade informacional é um modelo social distinto, fundamentado em redes tecnológicas e na microeletrônica, que viabiliza a produção, distribuição e organização da informação de maneira dinâmica (Castells, 1999). O conhecimento se torna um fator determinante para o crescimento econômico e inovação, tornando essencial o desenvolvimento de infraestrutura tecnológica e competências cognitivas avançadas. Segundo Castells (2006), esse novo paradigma de comunicação, denominado autocomunicação de massas, permite que indivíduos e coletivos disseminem conteúdos sem necessidade de mediação por veículos tradicionais.

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A transição para sociedades em rede impacta diretamente a identidade individual e coletiva, além de reformular a relação entre Estado e cidadãos. Para que os benefícios da Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) sejam plenamente aproveitados, é necessário que políticas públicas se adaptem a essa nova realidade, fortalecendo a capacitação educacional e promovendo inclusão digital (Castells, 1999). 

Sociedade de risco: incerteza e impossibilidade de controle 

O conceito de sociedade de risco, desenvolvido por Beck, Giddens e Lash (1997), destaca a crescente exposição a incertezas que escapam ao controle das instituições tradicionais. O avanço tecnológico, embora gere progresso, também cria riscos que não podem ser plenamente mensurados ou previstos. O acidente nuclear de Chernobyl, por exemplo, ilustra como os efeitos dos riscos contemporâneos podem ultraar gerações e desafiar sistemas regulatórios (Lemos, 2009). 

O risco na sociedade digital manifesta-se na segurança cibernética, na manipulação da informação e na dependência de sistemas tecnológicos. A modernização reflexiva, conforme Beck, Giddens e Lash (1997), evidencia como a sociedade, ao tentar controlar o risco, acaba por criar novas vulnerabilidades. Essa realidade demanda estratégias de mitigação, exigindo políticas regulatórias e medidas preventivas para minimizar impactos negativos no ambiente digital (Pereira, 2008). 

Sociedade do espetáculo: imagem, atenção e capitalismo de vigilância 

A obra de Guy Debord (1967) descreve a sociedade do espetáculo como um modelo social no qual a vida cotidiana é mediada por imagens e representações, distanciando os indivíduos da experiência autêntica. Com o advento da era digital, esse fenômeno se intensificou através das redes sociais, onde métricas, validação digital e curadoria de identidade tornam-se mecanismos centrais de interação (Montag; Duken, 2018). 

O espetáculo digital está interligado ao capitalismo de vigilância, conceito desenvolvido por Zuboff (2019), que descreve a coleta e comercialização de dados comportamentais como forma de controle social. Plataformas como Google, Facebook e TikTok lucram com a retenção do usuário e a monetização de sua atenção. Nesse sentido, os indivíduos não apenas consomem imagens, mas se tornam produtos dentro da economia da informação (Debord, 1997). 

Sociedade do cansaço: hiperprodutividade e exaustão mental 

Byung-Chul Han (2015) caracteriza a sociedade do cansaço como uma era de autoexploração, onde os indivíduos se percebem como empreendedores de si mesmos, impulsionados pela necessidade de desempenho contínuo. Esse modelo gera transtornos psíquicos, como ansiedade e depressão, e compromete a capacidade contemplativa dos indivíduos. 

Daniel Kahneman (2012) contribui para essa análise ao apresentar os sistemas cognitivos que regem o pensamento humano. O Sistema 1 é intuitivo e automático, enquanto o Sistema 2 é analítico e requer esforço. No contexto da sociedade de desempenho, o Sistema 2 é constantemente sobrecarregado, levando ao esgotamento mental e à dependência de decisões impulsivas. Essa dinâmica intensifica ciclos de hiperprodutividade e contribui para a fadiga cognitiva (Kahneman, 2012). 

Conclusão 

A era digital trouxe mudanças estruturais na organização social e econômica, mas também desafios significativos relacionados à segurança, identidade, atenção e exaustão mental. A interseção entre sociedade informacional, risco, espetáculo e cansaço evidencia como a digitalização reorganiza as formas de sociabilidade e cria novas tensões no cotidiano. Para que esses impactos sejam gerenciados de forma sustentável, é necessário adaptar políticas públicas e desenvolver estratégias que promovam inclusão digital, segurança da informação e equilíbrio entre produtividade e bem-estar. 

Foto Luiz Felipe Vieira de Siqueira Brasil: leis por emoção e não por razão Luiz Felipe Vieira de Siqueira é advogado, pesquisador do Think Tank ABES, Doutorando em Inovação & Tecnologia – PPGIT UFMG e sócio da Privacy Point. As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, os posicionamentos da Associação.

Referências 

BECK, U.; GIDDENS, A.; LASH, S. Modernização Reflexiva: Política, Tradição e Estética na Ordem Social Moderna. São Paulo: Editora Unesp, 1997. 

CASTELLS, M. A Sociedade em Rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999. 

DEBORD, G. A Sociedade do Espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997. 

HAN, B-C. Sociedade do Cansaço. São Paulo: Vozes, 2015. 

KAHNEMAN, D. Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012. 

LEMOS, F. Risco e Incerteza na Sociedade Contemporânea. Porto Alegre: Sulina, 2009. 

MONTAG, C.; DUKEN, H. Digital Phenomena and Dopamine Systems. Berlin: Springer, 2018. 

PEREIRA, R. Riscos da Modernidade: Ciência e Impactos Sociais. Belo Horizonte: UFMG, 2008. 

ZUBOFF, S. The Age of Surveillance Capitalism. New York: PublicAffairs, 2019.

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